Estudo chinês sobre Covid em gatos é criticado por pesquisadores

Experimento apresenta falhas e não retrata as condições naturais de possível contágio
Comunicação CFMV (adaptado pela Comunicação CRMV-SP)

O desencontro de informações, entretanto, cresce até mesmo entre os profissionais. Um estudo feito por pesquisadores chineses, ainda não avaliado por pares, foi notícia na revista Nature, na semana passada, e vem causando polêmica e questionamentos no meio da Medicina Veterinária.

Cães, porcos, galinhas, gatos, furões e patos foram expostos a altas doses de SARS-CoV-2 e a conclusão foi de que a capacidade de replicação e infecção se mostrou relativamente alta entre furões e, mais ainda, em gatos.

O estudo e sua divulgação pela conceituada revista, sem questionamentos, gerou críticas de pesquisadores brasileiros, publicadas no Jornal da USP, da Universidade de São Paulo. Na reportagem, o professor Paulo Eduardo Brandão, do Laboratório de Zoonoses Virais da Faculdade de Medicina Veterinária e Zootecnia (FMVZ/USP), é enfático: “Se eu fosse revisor e recebesse esse artigo, negaria a publicação”.

As falhas observadas no artigo chinês geraram um texto escrito por Brandão, em colaboração com a professora Aline Santana da Hora, do Departamento de Medicina Veterinária Preventiva da Faculdade de Medicina Veterinária da Universidade Federal de Uberlândia (UFU). Objetivo dos pesquisadores brasileiros foi alertar para que não se tomem conclusões precipitadas e para ajudar colegas que não possuem conhecimento pleno em virologia.

Em artigo, Colégio Médico Veterinário do Chile pede cautela e assinala que o trabalho dos pesquisadores chineses não é conclusivo

Experimento não retrata as condições naturais

Cristiano Nicomedes, presidente da Associação Brasileira de Clínicos de Felinos (Abfel), destaca ainda que o experimento foi realizado em um número muito pequeno de gatos filhotes para que se possa transpor os resultados encontrados para a população felina em geral.

“Questões metodológicas do trabalho podem ter influenciado, considerando que foram usados gatos filhotes, com inoculação experimental de alta carga viral. Essa faixa etária costuma ser imunossuprimida naturalmente, por falta de maturidade do sistema imune, e, o principal: as condições do experimento não retrataram as condições naturais de possível contágio”, comenta Nicomedes.

Estudo não é conclusivo

A médica-veterinária Rosangela Gebara, gerente de programas veterinários da ONG Proteção Animal Mundial e integrante da Comissão Técnica de Bem-estar Animal, do Conselho Regional de Medicina Veterinária do Estado de São Paulo (CRMV-SP), reforça que o estudo não é conclusivo e sua metodologia apresenta uma série de falhas.

Entre elas, estão a falta de informação sobre a saúde pregressa dos animais e estresse dos gatos, o que contraria os preceitos de bem-estar animal em biotérios e pode afetar resultados. “Pode ser que felídeos sejam mais suscetíveis, visto que animais do zoológico apresentaram sintomas, mas daí a replicar e passar a Covid-19 para o homem? Não há cientista que tenha provado isso”, enfatiza a médica-veterinária.

Cautela é a única certeza

Coordenadora da Unidade de Animais Silvestres do Hospital Veterinário da Universidade de Brasília (HVet/UnB), a professora Liria Hirano lembra da importância de cautela no trato com os animais em geral. “Temos de ter mais cuidado com os pets e, se as pessoas estiverem se isolando, protegidas, não há por que se preocupar com os animais silvestres”, observa.

Fernando Zacchi, assessor técnico da presidência do Conselho Federal de Medicina Veterinária (CFMV), destaca a orientação da OIE e do CFMV de que os animais domésticos não devem manter contato com pessoas infectadas. “O tutor infectado, ao espirrar ou tossir, poderá espalhar partículas com vírus na pelagem do animal. Se o pelo estiver contaminado e outra pessoa o tocar, não há garantia de que não haverá transmissão”, alerta.

Os pets que só fazem suas necessidades na rua devem ter as patas bem higienizadas ao retornar do passeio

(Fernando Zacchi)

Cuidado com notícias alarmistas sem confirmação científica. Agora, o que deve prevalecer é a racionalidade

(Cristiano Nicomedes)

Saiba mais:

Como cuidar dos animais em tempos de coronavírus

Faltam evidências que o novo coronavírus possa infectar gatos(Jornal da USP)

Reflexões para médicos veterinários sobre gatos e SARS-CoV-2s (em formato PDF, artigo dos professores Aline Santana da Hora e Paulo Eduardo Brandão)

Perguntas e respostas da Organização Mundial de Saúde Animal (OIE) – em espanhol

If You Have Animals – em inglês, informativo do Centers for Disease Control e Prevention (CDC), dos Estados Unidos

Artigo do Colégio Médico Veterinário do Chile (Colmevet)

Não há evidências científicas de que cães e gatos transmitem o novo coronavírus – informativo especial produzido pela organização Proteção Animal Mundial/World Animal Protection (WAP)

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